domingo, 8 de janeiro de 2017

QUEM É VOCÊ?



Raízes culturais é primeiro princípio do Programa Amor-Exigente e não dá para falar sobre ele sem nos perguntarmos quem somos. Será que possuímos uma identidade ou vivemos apenas de personagens exigidos pelos outros, pela moda ou pela mídia?

Muitos pais vivem repetindo, de forma entusiasta, que vivem em função dos seus filhos, mas porque viver em função dos filhos se podemos viver todos? É óbvio que os filhos merecem toda nossa atenção, todo nosso carinho, todo nosso amor, mas não precisamos nos abandonar em função do amor que sentimos por eles. Aqueles que vivem apenas em função do outro, não têm vida.     

Sem uma identidade, não somos vistos, não somos respeitados, nem levados a sério. Tornamo-nos invisíveis. Sem personalidade, apenas ocupamos espaço e não adianta cobrarmos nada do outro se não fizermos a parte que nos cabe.

Se desejamos ser respeitados, precisamos, primeiro, nos conhecer, saber quem somos, quais são nossos gostos, nossos projetos, nossos sonhos. Precisamos aprender a pensar, a questionar, a refletir e assim podemos nos posicionar, caso contrário, serviremos apenas como objeto de manobra, condicionados a pensar em massa e agir como máquinas.

Quantas mães e pais nos queixam que gostariam de maior atenção dos filhos, porém, enquanto os abastecem com roupas e tênis da melhor qualidade, vivem remendando os próprios chinelinhos. Se desejamos ser notados, precisamos nos apresentar e chamar a atenção. Isso não se resume a relação entre pais e filhos, serve também para o casal e para a vida em sociedade. 

Já pensando no próximo princípio do Programa Amor-Exigente, devemos aceitar o óbvio: nós também somos gente e como gente merecemos respeito, mas o respeito, a atenção e o amor do outro só conquistaremos a partir do momento em que aprendermos a nos valorizar, a nos respeitar e a nos amar e assim podemos nos apresentar com coragem e cabeça erguida: nós sabemos quem somos, nós estamos aqui.

            Texto de Celso Garrefa
            Sertãozinho SP

sábado, 17 de dezembro de 2016

SOBRIEDADE COMPORTAMENTAL




Certa vez, nas partilhas de grupo, os pais e mães falavam sobre a dependência dos filhos, quando uma participante, mostrando-se espantada ao ouvir os relatos, agradeceu a Deus o fato do seu filho não usar drogas. Então, um dos participantes perguntou-lhe: Quantos anos têm seu filho? - Vinte e cinco. Ele trabalha? – Não. Ele estuda? – Não. Ele coopera em casa? – Não. Ele respeita os membros da família? - Também não. 

Existem muitos jovens ou adultos que nunca fizeram uso de droga nenhuma, no entanto, apresentam desajustes comportamentais piores do que muitos usuários, e da mesma forma, causam transtornos e por isso precisam ser trabalhados, precisam ser corrigidos.

O Amor-Exigente não é um programa destinado apenas aos dependentes e seus familiares. Seu principal objetivo é o desenvolvimento do equilíbrio comportamental. Nesse sentido, ele destina-se a todos. Ao jovem que faz uso de substâncias ilícitas, aos não usuários, mas cujos comportamentos são uma droga, aos pais, que também não são perfeitos e possuem comportamentos a serem corrigidos, enfim, destina-se a todos aqueles que desejam experimentar a sobriedade comportamental.

Devemos compreender que a falta de sobriedade não está relacionada apenas ao abuso do álcool ou ao consumo de substâncias ilícitas, mas nas atitudes de cada um. Onde está a sobriedade de um político com as cuecas recheadas de dinheiro? E o que falar de autoridades eleitas pelo povo, como seus representantes, e quando assumem o poder afanam o dinheiro público, com voracidade sem limites? O que pensar de tantos desvios, tantas corrupções e favorecimentos ilícitos? Quanta falta de ética. Quantos comportamentos “droga”.

E nós, que nos indignamos com tudo isso, como agimos? E os nossos comportamentos, como vão? Furamos filas? Não cedemos lugar aos idosos? Jogamos entulhos em terrenos baldios? Mentimos para tirar alguma vantagem? Somos grossos e estúpidos? Calamo-nos diante de um troco a mais? Oferecemos ou aceitamos vantagens para fecharmos um contrato? Abusamos dos bens públicos? Espalhamos notícias fakes, sem verificar sua procedência? 

Antes de julgarmos os comportamentos do outro, devemos cuidar dos nossos. Nossas atitudes merecem, de nossa parte, vigilância constante, num trabalho permanente de construção da nossa sobriedade comportamental, pois um comportamento, quando não cuidado, também adoece e, consequentemente, adoece também aqueles que estão a nossa volta. 

            Texto de Celso Garrefa
            Sertãozinho SP

          

domingo, 11 de dezembro de 2016

SOBRIEDADE




Certa vez, falando a um grupo de internos em uma comunidade terapêutica, citamos que a recuperação não é para todos e que os melhores resultados não atingem o índice de trinta por cento de sucesso, ou seja, daqueles cinquenta internos do local, pelas estatísticas, apenas quinze conseguirão recuperar-se. Um dos internos levantou as mãos e, mostrando muita determinação, disse: eu serei um destes quinze.

            Lutar contra a dependência do álcool e ou de outras drogas é uma batalha que requer muita força de vontade e determinação do dependente. Mais do que isso, será necessário também estar disposto e aberto às mudanças. 

Aqueles que desejam uma nova vida, mas não são capazes de soltar as amarras que os prendem às drogas, não conseguem fazer a travessia. Lutam, lutam, mas apenas amassam barro. Muitos até conseguem alguns dias livre do consumo, no entanto, sem cortar as raízes que os prendem à dependência, logo voltam ao consumo. Mesmo aqueles que se internam por meses em clinicas ou comunidades terapêuticas, se não buscarem um novo jeito de viver, estão propensos a recaídas.

            O dependente na ativa cria rotinas e padrões de consumo, cada qual a seu modo, em uma sequência de ações, que inclui o envolvimento de grupos de amizade, dias certos de uso (normalmente finais de semana), horários, locais definidos, maneiras de conseguir as drogas. Eventos como baladas, churrascadas, determinadas músicas, também fazem parte da rotina, e cada um cria suas táticas de manipulações, mentiras e disfarces.

Todo esse ritual possui uma ligação íntima com o consumo da substância de uso e manter-se em sobriedade exigirá muito mais do que apenas parar de usar drogas. Será necessárias mudanças profundas para eliminar todos os fatores que impulsionam o uso. Há alguns dias, conversando com um amigo que está em sobriedade a mais de cinco anos, ele me disse que até hoje, quando sai do trabalho e passa em frente à loja de conveniência que frequentava na época da ativa, ele desvia o olhar para o lado oposto.

Uma vida livre das drogas requer atenção aos detalhes, que por mais inofensivos que pareçam, podem colocar tudo a perder. Manter-se afastado do grupo de consumo, desviar caminhos, evitar situações e locais, abandonar a vida louca e ocupar-se com algo novo. Mudar rotinas, buscar apoio e contato com pessoas que podem ajudá-los. Aprender a sossegar-se, desligando-se de tudo que anteriormente estava associado ao consumo, trocando um prazer destrutível por novas fontes de prazer que sejam saudáveis. Prazeres saudáveis são aqueles que nos fazem felizes, sem nos causar sofrimentos e, com determinação e atitudes poderemos redescobrir o quanto é bom viver em sobriedade.

Texto de Celso Garrefa
Amor-Exigente de Sertãozinho

sábado, 26 de novembro de 2016

AMOR-EXIGENTE DÁ CERTO?



         
Esta semana, uma mãe me questionou se o Amor-Exigente dá certo. É óbvio que jamais minha resposta seria não, pois não faria nenhum sentido eu estar a tanto tempo envolvido neste trabalho voluntário se eu não acreditasse nele, mas por outro lado, uma simples resposta sim, soaria como parcial e, além disso, entre o sim e o não existem os “considerandos”.

            Acredito sim que o Programa Amor-Exigente dá certo, porém não funciona para todos. Não funciona para aqueles que buscam uma solução mágica, acreditando que apenas uma reunião de duas horas será suficiente para reverter uma dependência de anos. Não funciona para aqueles que estão em busca de uma resposta pronta, como em uma receita de bolo. Não funciona para aqueles que só desejam empurrar o problema para os outros e não estão dispostos a fazer a parte que lhes cabe. Também não funciona para aqueles que nada desejam, ou seja, não estão contentes com a situação, porém não estão dispostos e abertos a mudanças.

            Amor-Exigente também não funciona para os familiares que buscam as reuniões com o propósito único e exclusivo de pegar um comprovante de frequência para apresentar na comunidade terapêutica onde o filho está em tratamento. Estes, durante as reuniões apenas esquentam cadeiras, não se envolvem e nem aderem às propostas apresentadas.

            Por outro lado, o Programa Amor-Exigente funciona muito bem para quem compreende a dinâmica do programa e persevera. Funciona para aqueles que, orientados e apoiados pelo grupo, se apoderam dos princípios básicos e éticos, vivenciando-os em seu dia-a-dia. Funciona para aqueles que possuem objetivos e com o apoio do grupo traçam metas para atingi-los, abandonando a falação e adotando a ação.

            Funciona para aqueles que, apesar da ansiedade em solucionar o problema, conseguem perceber que a cada reunião ocorrem avanços significativos, mesmo que eles pareçam quase imperceptíveis. Como já citei em um dos nossos textos, costumo comparar os trabalhos de um grupo de apoio à fase de crescimento dos nossos filhos.          Quem possui filhos pequenos, em fase de crescimento e estão com eles todos os dias, não se dá conta do quanto crescem. Basta chegar alguém que não os vê a seis meses ou mais para ouvirmos: “nossa, como ele cresceu”! Assim é com os trabalhos dos grupos de apoio. Desde a primeira participação nas reuniões, inicia-se um processo de evolução, de crescimento e de avanços em direção a solução do problema, mas precisamos compreender que este é um processo em construção, que não acontece da noite para o dia. A busca pelo imediatismo faz com que muitos desistem, acreditando que o programa não funciona. Aos que perseveram, não demora muito para as mudanças positivas tornarem-se nítidas.

            Em conclusão, o Amor-Exigente funciona quando nos permitimos sermos beneficiados por este programa que a cada encontro semanal nos incentiva a ser e estar cada vez melhor. Como diz Mara Menezes: “Acredite que dá certo”.

                    Texto de Celso Garrefa
                    Amor-Exigente de Sertãozinho SP

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

PRIMEIRA VEZ NO AMOR-EXIGENTE



A cada reunião semanal, o Programa Amor-Exigente recebe pessoas que procuram o grupo pela primeira vez.  Normalmente chegam fragilizadas, externando sinais visíveis de sentimentos profundos e precisamos acolhê-las com carinho e empatia.

Não é um momento fácil para a família e muitos relutam até tomar a decisão de buscar ajuda. Quando chegam trazem consigo muita frustração, acompanhada de um forte sentimento de culpa. Em geral, chegam com rostos abatidos, desesperançados, cheios de mágoas e sem rumo.

Chegam com a autoestima abalada, sem alegria de viver, como se nada mais fizesse sentido. A aparência exterior evidencia aquilo que seu interior tenta esconder. Em geral, vestem cores escuras e é notório o descuido com a própria aparência.

Quando chegam aos grupos relatam que já  tentaram de tudo, sozinhos em casa. Pensavam que seriam capazes de resolver o problema, e tentaram esconder, sem sucesso, aquilo que todos lá fora já sabiam. Normalmente chegam cheios de vergonha, de cabeça baixa e adoecidos, tentando enxergar uma luz no final do túnel.

Ao recebermos estes pais e mães, nossa primeira missão é acolhê-los, dar colo e emprestar-lhes ouvidos. Recebê-los sem nenhum tipo de preconceito, sem críticas e sem qualquer tipo de condenação. Não adianta enchê-los de teorias e explicações, muito menos apresentar-lhes soluções. Neste primeiro contato devemos falar o mínimo necessário e ouvir, ouvir e ouvir. O primeiro impacto que recebem ao chegarem ao grupo é automático: eles percebem que não estão mais sozinhos e que muitos outros enfrentam ou enfrentaram problemas semelhantes aos seus.

Os coordenadores que recebem os familiares que chegam pela primeira vez devem ser carismáticos, acolhedores e conduzir a reunião com empatia, visando atingir três metas. A primeira é fazer com que os familiares sintam-se acolhidos. A segunda é enchê-los de esperança de que seu desafio tem soluções e finalmente, a terceira meta é o resultado das duas primeiras, ou seja, que eles voltem para o próximo encontro. E aos coordenadores, devemos adotar a ideia de Madre Tereza de Calcutá: "Não podemos permitir que alguém saia da nossa presença, sem se retirar melhor e mais feliz". 

Texto de Celso Garrefa
Amor-Exigente Sertãozinho SP

PREVENÇÃO À RECAÍDA

Um dos maiores desafios no processo de tratamento da dependência química são as frequentes recaídas de uma parte das pessoas que buscam ajud...